Acabei de chegar a Macapá, a capital do estado do Amapá, para mais uma jornada de trabalho.
Inspirado na viagem, encontrei na livraria do aeroporto um livro com o sugestivo nome "Honoráveis Bandidos", com o rosto de José Sarney na capa, usando um óculos escuros ao estilo "Don Corleone".
Comprei e vim lendo no pequeno vôo de apenas 6 horas. Conclusão, li o livro inteiro.
Mesmo para mim que morei por três anos no Estado do Maranhão e achava que sabia de tudo e mais um pouco sobre o que se passou no periodo da Presidencia da Republica do ilustre cavalheiro, me admirei. Eu não sabia da missa a metade.
Palmério Dória, como ótimo jornalista investigativo, vai fundo nas descobertas da "Famiglia Sarney" e revela supreendentes, porem não menos esperados, escandalos e falcatruas dignas dos irmãos Frank e Jesse James.
Numa narrativa humorada (e ácida, por vezes) o escritor nos leva à sala de estar da família que comanda o Maranhão há mais de quatro décadas, revelando brigas, jogo de interesses e troca de favores entre várias gerações de políticos e bajuladores, dos cenários nacional e maranhense.
O lançamento do livro em São Luis do Maranhão foi cercado de fatos inéditos.
As livrarias se recusaram a lançar o livro, que teve que ser lançado no Sindicato dos Bancários e, obviamente, não podia terminar bem.
Segundo o sindicato, estudantes ligados à família Sarney jogaram ovos e uma torta na direção de Dória, em protesto contra o livro. Houve também uma discussão entre os participantes do evento e os manifestantes.
Em nota, o Sindicato dos Bancários do Maranhão condenou a violência.
"Os atos de vandalismo provocado por 10 a 15 baderneiros, quando da ocasião de lançamento do livro 'Honoráveis Bandidos' do jornalista Palmério Dória, nessa quarta-feira(04/11) em nossa sede, relembra os tristes fatos históricos das décadas de 50 e 60 em nosso Estado, que acreditávamos sucumbidos. Naquela época, prevalecia no Maranhão a lei da força bruta, da intolerância, em que as diferenças eram resolvidas pela pancadaria", citou a nota.
A Folha de São Paulo de 05/11/2.009 diz que:
"Além de detalhar todos os escândalos envolvendo o clã do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o livro, que está entre os mais vendidos no país, dedica um capítulo (nº 8, "O lado feminino") só para falar sobre as intimidades da família e de seu patriarca.
Na página 91, Dória escreve: "Sarney achou que seus sonhos poderiam concretizar-se em Nova York - o senador delirava só em pensar na realização de seu fetiche sexual: lambidas em seu hálux, ou, na linguagem popular, o dedão do pé. E rumou esperançoso para a capital do mundo ocidental, entre os convidados da Globo para a entrega de um daqueles prêmios internacionais, em tempos de boca-livre total."
"Não vi, não li, não me interessa",
disse Sarney à Livraria da Folha sobre "Honoráveis Bandidos".
Já é o 4º livro mais vendido do país.
Bem que poderiamos ter os livros "Honoráveis Bandidos" de todas as eras presidenciais. Quem sabe assim poderiamos comparar os "resultados da gestão de cada um dos nossos impolutos Presidentes da República do nosso amado Brasil, inclusive de nosso atual e seu ex - moralista e ético partido.
PALMÉRIO DÓRIA
A revista Veja publicou um trecho do livro, que eu copio aqui para o deleite dos meus leitores.
Agora que vale a pena ler ele todo, isso vale.
Comemoração com cara de velório • Por que Roseana chora, se os outros aplaudem? • Tem sujeira por trás do impoluto jurista o Rolo justifica outro rolo e assim por diante • A qualquer momento nas páginas policiais
Estamos em 2009. Na data em que completa meio século de carreira política, aos 78 anos, o velho coronel comemora sem o menor sinal de euforia. Por certo pesam-lhe na memória as palavras de seu falecido amigo Roberto Campos, tão entreguista que lhe pespegaram o apelido de Bob Fields, ministro do Planejamento de Castelo Branco, primeiro general de plantão do governo militar:
"Certas vitórias parecem o prenúncio de uma grande derrota. É um amanhecer que não canta."
Deputado federal, governador do Maranhão, presidente da República, cinco vezes senador. E, no início desse ano pré-eleitoral, eis que em 2010 se dariam eleições presidenciais, ele chegava pela terceira vez à presidência do Senado. Mas tinha a sensação de que tudo aquilo que havia conquistado em meio século de vida pública podia estar por um segundo. Não foi de bom agouro a cena que se seguiu a seu discurso de pouco mais de cinco minutos, ao apresentar sua candidatura à presidência da Casa, naquela manhã de 2 de fevereiro, dia de festa no mar. Em sua fala, ele citou por sinal Nossa Senhora dos Navegantes, depois de se comparar a Rui Barbosa pela longevidade na vida pública e de proclamar que não houve escândalos em suas outras passagens no cargo. Esperava uma sessão rápida, mas, para sua inquietação, vários pares passaram a revezar-se para defender o outro candidato à presidência do Senado, o petista acreano Tião Viana, e aproveitaram para feri-lo. Assim, quando abriram a inscrição para os candidatos, ele pediu para falar. Queria dar a última palavra.
Marcado pela fama de evitar confrontos em plenário, fugiu a seu estilo e fez um pronunciamento duro. Um improviso daqueles que a gente leva um mês para preparar. Deixou claro que não gostou de ver Tião Viana posar de arauto da modernidade e higienizador da podridão que paira nos ares do parlamento brasileiro.
Depois de lembrar a coincidência de 50 anos antes, quando no dia 2 de fevereiro de 1959 assumia o primeiro mandato no Congresso como deputado federal, atacou:
"Não concordo quando se fala na imoralidade do Senado. O Senado é os que aqui estão. Reconheço que, ao longo da nossa vida, muitos se tornaram menos merecedores da admiração do país, mas não a instituição."
Então, pronunciou as palavras seguintes, que trazem os sinais trocados, pois tudo quanto você vai ler é tudo quanto o velho senador não é:
"Durante a minha vida, passei aqui nesta Casa 50 anos. Muitas comissões, vamos dizer assim, muitos escândalos existiram envolvendo parlamentares, mas nunca o nome do parlamentar José Sarney constou de qualquer desses escândalos ao longo de toda a vida do Senado." Disse mais: "A palavra ética, para mim, que nunca fui de alardear nada, é um estado de espírito. Não é uma palavra para eu usar como demagogia ou uma palavra para eu usar num simples debate."
A filha Roseana Sarney, senadora pelo Maranhão, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro, o mesmo PMDB do pai, caminhava pelo plenário, muito nervosa. Estava em lágrimas quando o pai encerrou sua fala. Os oitenta pares o aplaudiram protocolarmente, mas um deles, de um salto pôs-se de pé e bateu palmas efusivas, acompanhadas do revoar de suas melenas. Tratava-se de Wellington Salgado, do PMDB mineiro, conhecido como Pedro de Lara ou Sansão.
Onde se encontravam os jornalistas de política nesse momento, que não registraram tal despautério? Pedro de Lara é aquela figura histriônica que roubava a cena no programa Silvio Santos como jurado ranzinza, debochado e falso moralista. E Sansão, o personagem bíblico que perdeu o vigor quando Dalila o traiu cortando-lhe a cabeleira.
Esta figura caricata pareceria um estranho no ninho em qualquer parlamento do mundo. Nascido no Rio, é dono da Universidade Oliveira Salgado, no município de São Gonçalo, e responde a processo por sonegação de impostos no Supremo Tribunal Federal. Conseguiu um domicílio eleitoral fajuto em Araguari, Minas Gerais, e praticamente comprou um mandato de senador ao financiar de seu próprio bolso, com 500 mil reais, uma parte da milionária campanha para o Senado de Hélio Costa, o eterno repórter do Fantástico da Rede Globo em Nova York.
Com a ida de Hélio para o Ministério das Comunicações de Lula, seu suplente Wellington então ganhou uma cadeira no Senado Federal, presente que ele paga com gratidão tão desmesurada, que separa da verba de seu gabinete todo santo mês os 7 mil reais da secretária particular do ministro. Nesse tipo de malandragem, fez como seu ídolo, colega de Senado Renan Calheiros, que vinha pagando quase 5 mil mensais para a sogra de seu assessor de imprensa ficar em casa sem fazer nada.
Mas o cabeludo senador chegou à ribalta em 2007, justamente como aguerrido integrante da tropa de choque que salvou o mandato de Renan Calheiros, então presidente do Senado e estrela principal do episódio mais indecoroso daquele ano, com amante pelada na capa da Playboy, bois voadores e fazendas-fantasma. O alagoano Renan, com uma filha fora do casamento, que teve com a apresentadora de tevê Mônica Veloso, bancava a moça com mesada paga por Cláudio Gontijo, diretor da construtora Mendes Júnior. Ao tentar explicar-se, Renan enredou-se em notas frias, rebanho superfaturado, rede de emissoras de rádio em nome de laranjas, enquanto Mônica mostrava aos leitores da revista masculina da Editora Abril a borboleta tatuada na nádega.
Durante 120 dias, enxotado pela mídia e pela opinião pública, Renan resistiu no cargo, suportando humilhações como o plenário oposicionista virando-lhe as costas no dia em que tentou presidir uma sessão. Esse era o Renan que, quase dois anos depois, no 2 de fevereiro de 2009 posaria vitorioso como articulador-mor da volta de José Sarney à presidência da Casa.
Quem diria, não? O José Sarney que já foi companheiro de um nacionalista respeitado como Seixas Dória, de um articulador do calibre de José Aparecido de Oliveira, de um jurista do porte de Clóvis Ferro Costa, todos três integrantes do grupo Bossa Nova, espécie de esquerda da União Democrática Nacional, a conservadora UDN, todos três ostentando o galardão de ter sido cassados pelo golpe militar de 1964, e sabe-se lá por quais artes só ele, Sarney, dentre os quatro amigos escapou da cassação, esse mesmo Sarney agora festejado pelo cabeludo sonegador e por uma das mais desmoralizadas figuras do cenário político brasileiro, Renan Calheiros, que tinha nos costados um inquérito com 29 volumes tramitando no Supremo.
Quer fechar o círculo direitinho? Em 2007, depois de absolvido pelo plenário em votação secreta e escapar da cassação por quebra de decoro parlamentar, na casa de quem Renan Calheiros comemorou a preservação do mandato? Na casa de seu salvador, Sarney, junto com outras figuras, como o deputado federal e ex-presidente do Senado Jader Barbalho, com know-how em renúncia para escapar de cassação; Romero Jucá, líder do PMDB no Senado; Edison Lobão, futuro ministro das Minas e Energia; e, claro, Roseana Sarney. Nesse festejo, no Lago Sul de Brasília, não se esqueceram de "homenagear" o senador amazonense Jefferson Peres. Esta fi gura íntegra do parlamento brasileiro, relator do caso Renan no Conselho de Ética, recomendou a cassação, pedida pelo povo brasileiro. Os convivas mimoseavam Jefferson a todo momento, referindo- se a ele como "aquele pobre relator".
Memorável dia 2 de fevereiro. Surpreendentes seriam as fotografias nos jornais do dia seguinte. Sarney de óculos escuros como os ditadores latino-americanos do passado, amparado pelo colega de PMDB Michel Temer, eleito presidente da Câmara, igualmente pela terceira vez. Barba e bigode. Este Michel Temer merece umas pinceladas.